O calendário judaico mostra hoje o décimo quinto dia do mês de Shevat. As famílias juntam-se. Os filhos rejubilam. É altura de celebrar o Ano Novo das árvores da terra de Israel, que emergem do seu sono de inverno e iniciam um novo ciclo de produção de frutas.
Cresci escutando histórias e lições dos tempos em que meu avô e sua família plantavam árvores e colhiam frutas em solo polaco - práticas que se perderam no período pós-guerra e na migração à vida urbana das grandes metrópoles, que ofuscam a relação indissociável do homem com o mundo botânico.
A tradição judaica faz uma interessante analogia entre as árvores e os seres humanos. As árvores são irmãs uma das outras, alimentam-se umas às outras e sabem que a vida de cada uma depende da vida de toda a floresta. As raízes respondem quimicamente aos intrusos e fazem com que troncos e galhos enfrentem os golpes da vida e cresçam mais belos e resistentes.
O mais relevante está oculto nas raízes e no micélio subterrâneos. A vida secreta das árvores inspira uma mensagem de vida, com capacidade para influenciar os acontecimentos acima da terra. Só na aparência é que as árvores estão sozinhas: debaixo delas há um mundo fabuloso, que as nutre de seiva divina para enfrentarem sol, frio, chuva, tempestades, secas e riscos de incêndio.
Que bom é contemplar as árvores portentosas de lindos frutos! Parecem símbolos de perfeição. No entanto, nem sempre as raízes são fortes e as pujantes árvores podem estar a viver as últimas horas na ignorância do que as espera. Uma árvore facilmente poderá despenhar-se sob o seu peso, beleza e majestade. Também no mundo dos homens é igual. Indivíduos que parecem árvores fortes, mas cujas raízes são fracas, poderão cair com estrépito. A vaidade humana assenta em madeira morta. A história judaica de quarenta séculos jamais conheceu um sábio vaidoso.
O judaísmo ensina que todos somos pó sujeito à sorte de variáveis infinitas. É necessário o constante aprofundamento das nossas raízes culturais, sentimentais, religiosas, familiares, de humildade, discrição, integridade e bondade.
A comunidade judaica deseja a todos um bom ano civil e, porventura, uma vida um pouco menos acelerada, que valorize as horas de pausa, reflexão e pensamento. O povo judeu guarda semanalmente o Shabat e, sob a mesma lógica, a Terra de Israel descansa a cada sete anos, no que é conhecido como Shmitá, período em que não é permitido arar, plantar, podar e colher - salvo casos muito especiais.
Hoje é Tu B'Shevat. O consumo de frutas tem um simbolismo profundamente religioso neste dia. Os frutos produzem sementes que produzem mais frutos que produzem sementes e assim sucessivamente até ao infinito. É a lógica divina da eternidade.
Fonte: Diário de Notícias